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A casa que só aparecia quando chovia

Leonan Carvalho sexta-feira, maio 09, 2025


 

Dizem que numa vila encravada entre as montanhas e o nevoeiro, havia uma casa que só aparecia nos dias de chuva.

Não era visível no sol, nem na seca. Mas bastava a primeira gota bater no chão — e ali ela surgia, feita de madeira úmida, cheiro de terra e calor invisível.


Dentro dessa casa vivia alguém como você.

Não era um eremita, nem um herói. Era alguém que tinha construído a casa com as próprias mãos depois que o mundo desabou.

Alguém que descobriu que, quando o céu desaba lá fora, a gente precisa ter onde se abrigar por dentro.


E sabe o que ele fazia nos dias de chuva?

Dormia. Escrevia. Escutava os pingos batendo no telhado como se fossem compassos.

E aceitava que havia dias em que simplesmente não se é forte. E tudo bem.


Porque a força real não está em nunca cair. Está em ter onde ficar, enquanto o mundo seca de novo.


A porta se abriu e ele o convidou para entrar , pediu que você deixasse os sapatos e as roupas pesadas na entrada.

— Venha,  sente-se não poltrona e se aqueça,  ha uma toalha seca e vou preparar um café pra você.

Ao se sentar você encontra um livrinho no aparador: "Como construir A sua casa de chuva(versão 1.0)" — intrigado você abre o livreiro que diz:


Essa casa não precisa ser grande. Mas é sua.

Ela aparece só quando você precisa — quando o corpo está pesado, quando o mundo grita demais, quando o silêncio dói.


A porta é feita de madeira firme. Não tranca por fora, só por dentro.

Quem entra é só você — e tudo que você não precisa fingir.

Ali dentro, a luz é baixa. Tem uma poltrona macia com um cobertor grosso. Um cheiro que te lembra infância ou liberdade.


Num canto, uma prateleira com tudo que você já fez e ninguém viu.

Projetos esquecidos, pequenos gestos, momentos em que você segurou o mundo e ninguém notou. Eles estão todos ali, visíveis. E brilham um pouco quando você se aproxima.


No outro canto, tem um caderno aberto. E nele, uma frase escrita por você mesmo:

“Você não precisa se provar aqui.”


Você pode deitar. Você pode dormir. Você pode só existir.

A chuva lá fora embala a casa. Não ameaça. Não assusta.

Ela avisa: aqui é lugar de pausa. De recomposição. De começar a se montar por dentro, mesmo sem saber como.

Dentro há um folheto entitulado 

Manual de Uso da Casa de Chuva


Quando usar:


Quando o corpo estiver pesado e você não souber explicar por quê.

Quando o silêncio machucar.

Quando tiver feito tudo certo… e mesmo assim, algo quebrar.

Quando o mundo pedir pressa, mas tudo em você gritar “não agora”.

 

Como entrar:


1. Feche os olhos, ou olhe pra algum ponto fixo.

2. Imagine o som da chuva lá fora — constante, sem urgência.

3. Sinta a porta da casa abrindo sem esforço.

4. Entre descalço. Você não precisa de armadura aqui.


O que fazer lá dentro:


Sentar no sofá que te envolve como um abraço.

Respirar devagar. Nem fundo, nem raso. Só no seu tempo.

Ouvir seus pensamentos como quem ouve um rio — sem tentar barrar, só deixar passar.

Olhar para a estante e reconhecer o valor de tudo que fez — mesmo o que ninguém viu.

Escrever uma palavra, uma frase, ou nada. Só estar ali já é cura.


Importante lembrar:


Ninguém entra sem ser convidado.

Não se espera produtividade aqui.

Toda emoção é bem-vinda.

Você não precisa consertar nada.

A chuva não vai durar para sempre — mas enquanto durar, essa casa é sua.


Então você percebeu que o alguém era você mesmo, e que você está aonde deve estar.




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